FLOR

Flor já não é mais flor, mas continua Flor! Dia desses encontrei Flor. Fazia um bom tempo que não via Flor. Ao me deparar com Flor, não senti aquele lampejo de outrora, não consegui expor meus galanteios! Quando Flor cruzou comigo, não virei o rosto para acompanhar seu deambular faceiro de alguns anos atrás. É, Flor não se fez notada por mim, apesar de anunciar um desabrochar vistoso em suas pétalas! Mais tarde, como um insulto do destino, Flor adentra no ônibus em que me encontrava. Meu primeiro gesto foi me levantar e oferecer-lhe a poltrona para que se sentasse. Isso irritou Flor, que chateada me falou: - Você está me chamando de velha? Pensa que não percebi seu desprezo por mim, quando nos cruzamos a cerca de uma hora. Você nem ao menos se virou para olhar minha bunda, seu ingrato! Não falei nada. Apenas fiquei olhando Flor. Ela não exibia mais as pétalas viçosas de anos atrás, quando a conheci num belo jardim! Seu balanço já não era o mesmo e havia desarmonia nos galhos que lhe sustentavam. Deduzi que o mau humor de Flor se iniciava logo pela manhã, quando o sol batia em seu rosto e a imagem refletida era de flacidez. E imaginei que Flor já não atraia mais lustrosos besouros mangangás! Conduzi a reflexão para mim. Encontro-me com um grau de miopia que já inspira cuidados e obriga o uso de óculos. Assim Como Flor, já não encanto tanto assim e minha visão já se abstém de enxergar o dia a dia. Estamos em igualdade de condições. As irresignações de Flor são egoístas. Ela também não fez os mesmos beicinhos dantes para mim! Focou-se apenas em si própria como se a idade fosse uma exclusividade dela. Não, ela avança sobre todos nós desde quando fomos expulsos do paraíso, com o corte do cordão umbilical. O processo se iniciou. Não há paradas... Não há descansos... Não há férias para a idade! O ônibus pára! Flor desce. Olhei-a como uma paisagem que se move até o deslocamento total de minha retina. Aí, Flor se transformou num vulto sem beleza. Numa estética que não mais me fascina! Gilberto Costa

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