O RESGATE DO LIVRO

Antes de ser funcionário do INSS, passei um período como estagiário da Caixa Econômica Federal, na condição de estudante da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, atuando como responsável pelo Crédito Educativo. Foi um momento de divina riqueza aquele estágio, proporcionando-me visão sobre valores éticos e profissionais. Afirmo que a oportunidade que me foi dada em muito tem contribuído para lidar com o gerenciamento de conflitos humanos na autarquia previdenciária.

Bem, ao começar a ganhar alguns trocados como estagiário, passei a investir numa de minhas grandes paixões que é a leitura. E me tornei sócio do Círculo do Livro. O Círculo do Livro foi uma editora brasileira estabelecida em 1973 através de um acordo firmado entre o Grupo Abril e a editora alemã Bertelsmann. Vendia livros por um "sistema de clube", onde a pessoa era indicada por algum sócio e, a partir disso, recebia uma revista quinzenal com dezenas de títulos a serem escolhidos. O novo sócio teria então a obrigação de comprar ao menos um livro no período.

Um dos primeiros livros adquiridos junto ao Círculo foi TODOS SEREMOS IRMÃOS, de J M Simmel. A história fala de Richard Mark - um escritor que não consegue mais criar - e descobre, por acaso, que um respeitado médico é, na verdade, um criminoso de guerra nazista. Denuncia-o e a partir daí se vê envolvido numa rede de intrigas e de violência que visa a dar fuga ao criminoso de guerra. Deixa pra lá, não é intenção falar do conteúdo do livro e sim de seu resgate.

Investindo em livros formei uma biblioteca razoável e nunca me furtei em dividi-la com aqueles que me fazem visitas e se sentem atraídos por alguma obra exposta na estante. E o faço sem anotar o empréstimo, não tendo controle sobre as saídas que não são poucas, confesso. Esse hábito não se constitui em descuido. É de o meu feitio achar que serão devolvidos por imaginar que todos são conscientes de que livros não podem ser retidos. Eles precisam circular por muitas mãos. Eles precisam ser folheados com mais constância. E assim aconteceu com TODOS SEREMOS IRMÃOS! Ele saiu de seu habitat e foi parar na banca de revistas e livros usados de Seu Antonio, na Avenida Coronel Martiniano, e adquirido por uma senhora boa de leitura, residente em João Pessoa/PB, em visita a nossa Caicó/RN para rever uma filha que trabalha comigo no INSS. O sucedido ocorreu a cerca de dez anos

Dias desses a colega de trabalho, num papo sobre livros no pouco tempo que nos resta pela exigência da nossa profissão, fala-me desse fato. Diz-me que só descobriu que o livro me pertencia por um poema existente em uma de suas folhas e pela caligrafia já conhecida em face da convivência de vinte e cinco anos, e proporciona a volta do livro para junto de seus irmãos! E mãe biblioteca, deprimida até então com sua falta, volta a sorrir por tê-lo novamente em seus braços! Ele é um filho de sua estima! Há muitos outros que ela nutre a esperança de um dia retornarem ao seu antigo lar. Digo-lhe que não precisa exercitar tanto esse sonho. Quem sabe estejam vivendo melhor no seio de outras estantes.

Dom Casmurro, por exemplo, deve estar casado com Lolita! Ana Karênina com Dom Quixote! São Histórias Extraordinárias como As Viagens de Gulliver, que valem ser lembradas em mesmo não sendo uma Odisséia!

Sinto um Perfume... Percebo minha Infância contemplando O Sorriso do Lagarto no Castelo! O Retrato de Dorian Gray me faz lembrar que Suave é a Noite! E há espaços na estante me causando Insônia... E são como O Morro dos Ventos Uivantes!

Gilberto Costa

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